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Hickory Dickory Dock - uma proposta de brincadeira estruturada bilíngue


A base de pesquisa e intervenção que orienta o ensino estruturado é conhecida como método TEACCH (Treatment and Education of Autistic and Communication related handicapped Children - Tratamento e Educação para Autistas e Crianças com Limitações), criado na década de 1971 pelo psicólogo Eric Schopler e seus colaboradores na Universidade da Carolina do Norte (EUA).


O modelo foi pensado como uma proposta de ensino estruturado capaz de facilitar a inserção das pessoas com autismo e outras condições relacionadas com o desenvolvimento da comunicação e da aprendizagem dentro dos ambientes em que elas vivem, propiciando-lhes maior autonomia, independente do seu nível de funcionamento ou de sua idade (SCHOPLER, 1980).


Quando falamos de intervenções que se baseiam na música, o modelo TEACCH se apresenta como uma proposta condizente com a necessidade de estruturação das atividades, pois dá suporte para a organização visual da aprendizagem dos sons e das rotinas. Seguindo a metodologia de o material ser autoexplicativo e limpo de distratores, com grau crescente de dificuldade, “condições bem estruturadas, com regras simples, com os espaços bem organizados, materiais e atividades adaptadas às diferenças individuais de cada criança” (GONÇALVES, 2011), também há a preocupação de se trabalhar os mesmos conteúdos que são oferecidos a pessoas neurotípicas, em uma abordagem inclusiva.


A metodologia segue quatro níveis de trabalho que norteiam o desenvolvimento de habilidades motoras, cognitivas, neuropsicológicas e acadêmicas. A lógica desses níveis é construída a partir da aprendizagem humana, que parte da exploração sensorial, do concreto, para então alcançar níveis refinados de abstração (FONSECA E CIOLA, 2014). Assim, vou apresentar para vocês uma possibilidade de trabalho de ensino estruturado (em 4 níveis), com a canção popular Hickory Dickory Dock (lembrando que a forma de apresentar as músicas/atividades podem ter diversas configurações de acordo com o ensino estruturado, e os níveis de ensino não se limitam aos que eu vou indicar aqui. Além disso, a criatividade é importante na hora de realizar as variações nas brincadeiras, e que o que eu proponho aqui é apenas uma ideia, que espero que inspire o trabalho de vocês!).


Para quem ainda não conhece, a seguir deixo o link da minha versão preferida de Hickory Dickory Dock, a partitura e a letra em inglês com a tradução para o português (por se tratar de uma canção popular, existem muitas versões, com animais diferentes e modificações tanto na melodia quanto no desenvolvimento da história).




Nível 1 - habilidades sensório-motoras e uso de materiais concretos

Ouvir e fazer músicas por si só já envolve a exploração-sensório motora. Nesse momento é importante apresentar a música para a criança, deixá-a ouvir, sentir e experimentar os sons, seja cantando, tocando (se a música é nova, ofereça instrumentos que a criança já conhece), dançando (vocês podem imitar a forma de andar dos animais, os seus sons e/ou representar os movimentos da história desenhando um relógio no chão) ou fazendo escuta ativa - tanto em português, quanto em inglês. Em um segundo momento, faça uso de materiais concretos, ou seja, brinquedos que representem os animais. Eu não tenho os mesmos bichos que estão indicados no vídeo da música, mas como nesse momento a criança já deve estar familiarizada com a proposta, você pode fazer variações utilizando os brinquedos que tem disponível, pois trabalhar a flexibilização é essencial! (veja o exemplo na foto a baixo - utilizei elefante [elephant], rato [mouse], cachorro [dog], tartaruga [turtle], jacaré [alligator] e zebra [zebra]).



Nível 2 - pareamento

Aqui eu sugiro utilizar fotos de animais e desenhos que os representem. Você pode fazer pareamento das fotos/desenhos com os brinquedos que já utilizou e, posteriormente, parear essas imagens com suas sombras. Aqui a criança já passa a ter contato com diversas formas de representar o mesmo animal, e mais uma vez estamos trabalhando sua flexibilidade cognitiva. A baixo veja um exemplo de desneho-sombra para pareamento.


Nível 3 - identificar letras

Com crianças entre 2 e 3 anos (e que ainda não são alfabetizadas), você pode realizar o nível 3 associando os personagens da música com suas letras iniciais. Colaborando com o processo de alfabetização (lembrando que estamos trabalhando a música em duas línguas, então cada animal poderá ter duas letras iniciais). Você pode apresentar as letras conforme a figura a baixo e depois que a criança estiver familiarizada, espalhá-las pela sala e solicitar que o pareamento seja feito.


Nível 4 - Relacionar imagem com palavra escrita

O último nível pressupõe a chegada à alfabetização, então essa atividade pode não ser adequada para crianças pequenas (menores de 6 anos de idade), exceto aquelas que passam por processo natural de alfabetização precoce (e com natural eu quero dizer que nenhum adulto forçou a criança a aprender, mas tudo partiu do interesse dela em desvendar a palavra escrita). E como estamos trabalhando o bilinguismo Português-Inglês, as associações se darão com as palavras nas duas línguas.


Últimas reflexões...

Lembrando que essa é apenas uma proposta, certamente você terá ideias diferentes e para ter certeza de que elas funcionam, precisar testar com as suas crianças. A minha ideia funcionou com algumas crianças que atendo e que estão se alfabetizando nas duas línguas, mas para outras crianças, essa música e essas propostas podem ser desinteressantes, então não farão sentido dentro da sua intervenção, seja ela Musicoterapia ou Educação Musical. Assim como eu também só faço a versão em português para aquelas crianças que não estão interessadas em aprender uma língua estrangeira.


Algumas crianças não serão capazes de alcançar os 4 níveis na mesma atividade, pois sua idade cronológica e/ou de desenvolvimento não condiz com a demanda, e tudo bem! Se esse for o caso, é necessário desenvolver outras atividades dentro de um mesmo nível, até que a criança seja capaz de superá-lo e então você pode retomar canções antigas do repertório, mas apresentando-as de forma remodelada, com novos desafios.


Lembre-se, o ensino estruturado não traz atividades prontas, mas um molde para adaptarmos atividades do interesse e a realidade da criança, facilitando seu desenvolvimento e aprendizagem!



Referências


GONÇALVES, A. D. Os modelos de intervenção são eficazes para melhorar a inclusão de crianças com autismo. Dissertação de mestrado, Escola Superior de Educação Almeida Garrett. Lisboa, Portugal, 2011.


FONSECA, M. E. G.; CIOLA, J. de C. Vejo e Aprendo: Fundamentos do Programa TEACCH. O Ensino Estruturado para Pessoas com Autismo. 1° edição. Book Toy, 2014.


SCHOPLER, E.; REICHLER, R. J.; LANSING, M. Individualized assessment and treatment for Autistic and developmentally disable children. Baltimore, University Park Press, 1980.


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